sábado, 8 de março de 2014

MANUEL RUI - LÁGRIMA


   

LÁGRIMA

MANUEL RUI


                    I

assim tão de repente
uma enxada pensou que era já chuva
quando esta lágrima caiu

assim tão de repente
um torno
pensou que era suor operário
quando esta lágrima caiu

assim tão de repente
a arma sentinela madrugada
pensou que fosse orvalho
quase nada
quando esta lágrima caiu

assim tão de repente
um livro numa escola
julgou muito inocente
que os professores voltavam a tosar
ia queixar ao camarada presidente
mas viu também as letras a chorar.


                    II

esta lágrima é grossa
e não escolhe onde cair

caiu no mar
e o mar ficou sem remo
do mar até à praia
os pés sem terra
um silêncio de areia
a onda de perguntas
a demandar o caminho das estrelas.

esta lágrima é grossa
e não escolhe onde cair

e cai ainda mais
de ver cair dos olhos dos meninos
choro sem fim no lenço que era teu
o lenço do futuro

(alguém roubou o sol a este fruto
antes de ser maduro).

   

Nenhum comentário:

Postar um comentário