quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

VINÍCIUS DE MORAES - SONETO DE CONTRIÇÃO




SONETO DE CONTRIÇÃO

VINÍCIUS DE MORAES

Eu te amo Maria, te amo tanto
Que o meu peito me dói como em doença.
E quanto mais me seja a dor intensa
Mais cresce na minha alma teu encanto.

Como a criança que vagueia o canto
Ante o mistério da amplidão suspensa
Meu coração é um vago de acalanto
Berçando versos de saudade imensa.

Não é maior o coração que a alma
Nem  melhor a presença que a saudade.
Só te amar é divino, e sentir saudade...

E é uma calma tão feita de humildade
Que tão mais te soubesse pertencida
Menos seria eterno em tua vida.

OLEGÁRIO MARIANO - ESQUECIMENTO




ESQUECIMENTO

OLEGÁRIO MARIANO

Para quem pelo amor se martiriza
E perde pelo amor o último alento,
Dizem que o bem melhor é o esquecimento
Que, se não cura o mal, o mal suaviza.

Como esquecer se há um fixo pensamento
Que à mulher que se amou nos escraviza?
Ela está presa a nós pelo tormento,
Em tudo, até no chão que a gente pisa.

Como esquecer alguém que está presente
Na nuvem que o crépusculo escurece
Numa folha que tomba na corrente?

Como fugir à dor de ouvi-la e vê-la?
Maldito esquecimento que se esquece
Que é mais fácil morrer do que esquecê-la.

ALPHONSUS DE GUIMARAENS - COMO SE MOÇO E NÃO BEM VELHO EU FOSSE




COMO SE MOÇO E NÃO BEM VELHO EU FOSSE

ALPHONSUD Guimaraens

Como se moço e não bem velho eu fosse,
uma nova ilusão veio animar-me,
Na minh'alma floriu um novo carme,
O meu ser para o céu alcandorou-se.

Ouvi gritos em mim como um alarme.
E o meu olhar,outrora suave e doce,
Nas ânsias de escalar o azul, tornou-se
Todo em raios, que vinham desolar-me.

Vi-me no cimo eterno da montanha
Tentando unir ao peito a luz dos círios
Que brilhavam na paz da noite estranha.

Acordei do áureo sonho em sobressalto;
Do céu tombei ao caos dos meus martírios,
Sem saber para que subi tão alto...

J. G. DE ARAÚJO JORGE - A PIOR SOLIDÃO




A PIOR SOLIDÃO

J. G. DE ARAÚJO JORGE

Pior do que a solidão pura e simples,
a solidão dos ascetas
ou dos insanos

(a mansa solidão, torre de êxtase e prece
ou a áspera solidão que aterra e apavora),

é esta povoada pelo fantasma de um amor
que havemos de carregar pelos anos afora...

NEL CÂNDIDO - HOJE, AINDA QUENTE TEU LEITO DE MORTE




HOJE, AINDA QUENTE TEU LEITO DE MORTE

NEL CÂNDIDO

Hoje, ainda quente teu leito de morte,
sinto em meu peito, tão viva, a chama da dor.
Um vento a que chamam desespero, 
atiça este fogo em minha alma infernizada.
Não há consolo, 
porém uma malquista experiência
sussurra-me ao ouvido que o vento acalmará, 
que a chama cessará,
que dos dois restará,
desta uma brasa, 
daquele uma brisa,
de ambos, juntos,
algo que definem por saudade.

ÁLVARES DE AZEVEDO - SONETO




SONETO 

ÁLVARES DE AZEVEDO

Pálida, à luz da lâmpada sombria,
Sobre o leito de flores reclinada,
Como a lua por noite embalsamada,
Entre as nuvens do amor ela dormia!

Era a virgem do mar! Na escuma fria
Pela maré das águas embalada!
Era um anjo entre nuvens d'alvorada
Que em sonhos se banhava e se esquecia!

Era mais bela! O seio palpitando...
Negros olhos as pálpebras abrindo...
Formas nuas no leito resvalando...

Não te rias de mim, meu anjo lindo!
Por ti - as noites eu velei chorando,
Por ti - nos sonhos morrerei sorrindo!

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

MARIO QUINTANA - SE EU FOSSE UM PADRE




SE EU FOSSE UM PADRE

MARIO QUINTANA

Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,
não falaria em Deus nem no Pecado
- muito menos  no Anjo Rebelado
e os encantos das suas seduções,

não citaria santos e profetas:
nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...
Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,

rezaria seus versos, os mais belos,
desses que desde a infância me embalaram
e quem me dera que alguns fossem meus!

Porque a poesia purifica a alma
... e um belo poema - ainda que de Deus se aparte -
um belo poema sempre leva a Deus!

domingo, 24 de fevereiro de 2013

MARIO QUINTANA - EU ESCREVI UM POEMA TRISTE




EU ESCREVI UM POEMA TRISTE

MARIO QUINTANA

Eu escrevi um poema triste
E belo, apenas de sua tristeza.
Não vem de ti essa tristeza
Mas das mudanças do Tempo,
Que ora nos traz esperanças
Ora nos dá incerteza...
Nem importa, ao velho Tempo,
Que sejas fiel ou infiel...
Eu fico, junto à correnteza,
Olhando as horas tão breves...
E das cartas que me escreves
Faço barcos de papel!

RAIMUNDO CORREA - MAL SECRETO




MAL SECRETO

RAIMUNDO CORREA

Se a cólera que espuma, a dor que mora
N'alma e destrói cada ilusão que nasce
Tudo o que punge, tudo o que devora
O coração, no rosto se estampasse;

Se se pudesse o espírito que chora,
Ver através da máscara da face,
Quanta gente, talvez, que inveja agora
Nos causa, então piedade nos causasse! 

Quanta gente que ri, talvez consigo
Guarda um atroz, recôndido inimigo,
Como invisível chaga cancerosa!

Quanta gente que ri talvez existe,
Cuja ventura uníca consiste
Em parecer aos outros venturosa!

OLEGÁRIO MARIANO - TORTURA




TORTURA

OLEGÁRIO MARIANO

Não paga a pena de viver tamanha
Ansiedade de amor!  Noite e dias
Ergue-se entre nós dois uma montanha
de proporções terríveis e sombrias.

Ningúem para galgá-la me acompanha.
Luto batido pelas invernias
Para voltar do horror dessa campanha
De corpo fatigado e mãos vazias.

Nada trouxe de ti. Ficou-me apenas
Nos dedos a carícia que me deste -
Andei por certo machucando penas - 

E no rosto que as mágoas torturaram,
Como o leito dos rios do Nordeste, 
Os dois sulcos que as lágrimas cavaram.

sábado, 23 de fevereiro de 2013

VINÍCIUS DE MORAES - SONETO DE LONDRES




SONETO DE LONDRES

VINÍCIUS DE MORAES

Que angústia estar sozinho na tristeza
E na prece! que angústia estar sozinho
Imensamente, na inocência! acesa
A noite, em brancas trevas o caminho

Da vida, e a solidão do burburinho
Unindo as almas frias à beleza
Da neve vã; oh, tristemente assim
O sonho, neve pela natureza!

Irremediável, muito irremediável
Tanto como essa torre medieval
Cruel, pura, insensível, inefável

Torre; que angústia estar sozinho! ó alma
Que ideal perfume, que fatal
Torpor te despetala a flor do céu?

GEIR CAMPOS - OS MANDAMENTOS


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OS MANDAMENTOS

GEIR CAMPOS

Amar como um homem amando
viver como um homem vivendo
ousar como um homem ousando
saber como um homem sabendo
sonhar como um homem sonhando
querer como um homem querendo
lutar como um homem lutando
morrer como um homem morrendo.

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NEL CÂNDIDO - Ó BELA VIDA, QUE O AMOR DE DEUS CRIOU




Ó BELA VIDA, QUE O AMOR DE DEUS CRIOU

NEL CÂNDIDO

Ó bela vida, que o amor de Deus criou
pra ser vivida como um canto de louvor,
- hino de amor a quem sem si é o próprio Amor -
por que a chama do amor se apagou?

Tinhas outrora um olhar terno, humano,
compadecido com as dores dos mortais;
hoje tu tens olhar que é quase desumano,
dos sofredores não escutas os seus ais.

Ó bela vida, vais perdendo a beleza
que o Criador te concedeu ao te gerar,
pois já não amas.  Vives hoje a avareza
pela qual, ó vida, tu te deixas matar.

J. G. DE ARAÚJO JORGE - AH, SE TU VOLTASSES...


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"AH, SE TU VOLTASSES..."

J.G. DE ARAÚJO JORGE

Fico a me repetir, que se voltares
te olharei nos olhos sem tremer
e te direi, vingando a minha mágoa:
- já não te quero mais.

Mantenho assim de pé o orgulho
a esta espera...
..............................................................

Ah, se tu voltasses!
(Só de pensar, sinto uma angústia, um nó
a me apertar o peito...)
- seria até capaz de ter um infarto
com este coração já tão batido
e que morre por ti, de qualquer jeito.

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ÁLVARES DE AZEVEDO - MINHA DESGRAÇA


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MINHA DESGRAÇA

ÁLVARES DE AZEVEDO

Minha desgraça não é ser poeta.
Nem na terra de amor não ter um eco,
E meu anjo de Deus, o meu planeta,
Tratar-me como trata-se um boneco...

Não é andar de cotovelos rotos,
Ter duro como pedra o travesseiro...
Eu sei... O mundo é um lodaçal perdido
Cujo sol (quem mo dera!) é o dinheiro...

Minha desgraça, ó cândida donzela,
O que faz que o meu peito blasfema,
É ter para escrever todo um poema
E não ter um vintém para uma vela.

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quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

MARIO QUINTANA - EU FAÇO VERSOS COMO OS SALTIMBANCOS...




EU FAÇO VERSOS COMO OS SALTIMBANCOS

MARIO QUINTANA

Eu faço versos como os saltimbancos
Desconjuntam os ossos doloridos.
A entrada é livre para os conhecidos...
Sentai, Amadas, nos primeiros bancos!

Vão começar as convulsões e arrancos
Sobre os velhos tapetes estendidos...
Olhai o coração que entre gemidos
Giro na ponta dos meus dedos brancos!

"Meu Deus! Mas tu não mudas o programa?" - 
Protesta a clara voz das Bem-Amadas.
"Que tédio!" o coro dos Amigos clama.

"Mas que vos dar de novo e de imprevisto?" - 
Digo... e retorço as pobres mãos cansadas:
"Eu sei chorar... Eu sei sofrer... Só isto!"

NEL CÂNDIDO - NEM ENTRADAS OU BANDEIRAS ALARGARÃO...




NEM ENTRADAS OU BANDEIRAS ALARGARÃO

NEL CÂNDIDO

Nem entradas ou bandeiras alargarão
o pequeno espaço que é a minha pátria. 
Minha terra é onde estão minhas raízes.

As fronteiras já não têm significado, 
as paredes já não podem me guardar. 
O meu lar é onde estão minhas lembranças.

OLEGÁRIO MARIANO - SUPREMO CASTIGO


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SUPREMO CASTIGO

OLEGÁRIO MARIANO

Não fiz por merecer tanto castigo, 
tanta mentira e tanta falsidade. 
De inquietações e de intranquilidade
Foi a vida que deste ao teu amigo. 

A ave batida pela tempestade
Teve em meu coração consôlo e abrigo.
Que importa o que passou? Murcha contigo
A última flor da minha mocidade.

Fiz um ídolo de ti, uma obra-prima.
Para ter o condão de compreender-te,
Dei-te sangue no verso e amor na rima.

Hoje, desiludido e malogrado, 
Sinto maior que a mágoa de perder-te, 
A humilhação de não ter sido amado. 

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CECÍLIA MEIRELES - RETRATO




RETRATO

CECÍLIA MEIRELES

Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro, 
nem estes olhos tão vazios, 
nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força, 
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração 
que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida
a minha face? 

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

LUÍS GUIMARÃES JÚNIOR - VISITA A CASA PATERNA


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VISITA A CASA PATERNA

LUÍS GUIMARÃES JÚNIOR
                           (a minha irmã Isabel)

Como a ave que volta ao ninho antigo, 
Depois de um longo e tenebroso inverno,
Eu quis também rever o lar paterno,
o meu primeiro e virginal abrigo:

Entrei. Um genio carinhoso e amigo,
O fantasma talvez do amor materno,
Tomou-me as mãos, - olhou-me, grave e terno,
E, passo a passo, caminhou comigo.

Era esta a sala... (Oh! se me lembro! e quanto!)
Em que da luz noturna à claridade,
Minhas irmãs e minha mãe... O pranto

Jorrou-me em ondas... Resistir quem há-de?
- Uma ilusão gemia em cada canto,
Chorava em cada canto uma saudade.

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ALVARENGA PEIXOTO - EU VI A LINDA JÔNIA


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EU VI A LINDA JÔNIA

ALVARENGA PEIXOTO

Eu vi a linda Jônia e, enamorado
fiz logo eterno voto de querê-la; 
mas vi depois a Nise, e é tão bela
que merece igualmente o meu cuidado.

A qual escolherei, se nesse estado
eu não sei distinguir esta daquela?
Se Nise vir, morro por ela,
se Jônia vir aqui, morro abrasado.

Mas, ah! que esta me despreza, amante, 
pois sabe que estou preso em outros braços,
e aquela não me quer, por inconstante.

Vem, Cupido, soltar-me desses laços:
ou faze desses dois um só semblante,
ou divide o meu peito em dois pedaços!

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