quinta-feira, 3 de abril de 2014

JOFRE ROCHA - DE MÃOS VAZIAS


feca1ac8d772 (421x76, 3Kb)

DE MÃOS VAZIAS

JOFRE ROCHA

as mãos trago-as vazias
só nos olhos conservo o sonho.

e no íntimo
guardo recordações amargas
do gênero dito humano.

as mãos trago-as vazias
mas volto rico de presentes
para todos vós, camaradas.

minha bagagem de escravo forro,
ei-la:
um punhado de folhas soltas
contendo meus versos tristes
sabendo a fome e maresia.

as mãos trago-as vazias
e minha bagagem são só versos tristes...

mas para vós, camaradas
trago um peito aberto
para as dores do nosso sofrer
trago os braços abertos
para a solidariedade dum abraço.

volto de mãos vazias
de mãos vazias sim, camaradas,
mas nos olhos conservo o sonho.

feca1ac8d772 (421x76, 3Kb)

DANTE MILANO - CENÁRIO



(400x40, 3Kb)

CENÁRIO

DANTE MILANO

Tudo é só, a montanha é só, o mar é só,
A lua ainda é mais só.
Se encontrares alguém
Ele está só também.

Que fazes a estas horas nesta rua?
Que solidão é a tua
Que te faz procurar
O cenário maior,
O de uma solidão maior que a tua?

(400x40, 3Kb)

MÁRIO ANTÓNIO - DRAMA




DRAMA

MÁRIO ANTÓNIO

o drama é bem maior do que supunha:
é o drama das raízes arrancadas
e dos sonhos esquecidos
pela força não do tempo!

ai o menino de olhos muito abertos
a quem um pai humano segredou
paragens impossíveis de alcançar!

ai o púbere menino que sonhou
por amante a donzela de olhos doces
de meigas falas leves imprecisas
que tinha sempre um carro à porta do colégio!

ai dele! o pequeno sonhador
que poderia morrer inda menino
os sonhos na mão intactos e o destino
debaixo das longas pálpebras guardado!

ai dele que abriu os olhos e que viu:
seu castelo de poeta; um quarto sem janelas
a cama sem lençóis e num caixote
um monte de papéis cheios de sonhos!

ai dele, que abriu os olhos e se viu:
pobre criança triste, abandonada
mendigando na rua proteções!
ai dele:
antes nunca abrisse os olhos!

BARÃO DE PINDARÉ JÚNIOR - NÃO HÁ MAIS POETAS COMO ANTIGAMENTE


     

NÃO HÁ MAIS POETAS COMO ANTIGAMENTE

BARÃO DE PINDARÉ JUNIOR

Não há mais poetas como antigamente:
multidões esperando-os nas estações.
Edições atrás de edições, saraus
e academias saudando-os freneticamente.

Ouviam estrelas, tocavam harpas
e até lançavam farpas, vitupérios,
faziam vigília, louvavam Marília,
morriam de amor
e tuberculose,
ou de overdose
absyntho, droga
ou de remédio.

Agora morremos de tédio.

     

MANUEL BANDEIRA - FELICIDADE




FELICIDADE

MANUEL BANDEIRA

A doce tarde morre. E tão mansa
Ela esmorece
Tão lentamente no céu de prece,
Que assim parece, toda repouso,
Como um suspiro de extinto gozo
De uma profunda, longa esperança
Que, enfim, cumprida, morre, descansa...

E enquanto a mansa tarde agoniza,
Por entre a névoa fria do mar
Toda a minhalma foge na brisa:
Tenho vontade de me matar!

Oh, ter vontade de se matar!
Bem sei é coisa que não se diz.
Que mais a vida me pode dar?
Sou tão feliz!

- Vem, noite mansa...

AMÊNDOA AMARGA


     2 (573x138, 100Kb)

AMÊNDOA AMARGA

LETRA: ARY DOS SANTOS
MÚSICA: ALAIN OULMAN
CANTA: AMÁLIA RODRIGUES

Por ti falo e ninguém pensa
mas eu digo minha amêndoa, meu amigo, meu irmão
meu tropel de ternura, minha casa
meu jardim de carência, minha asa.

Por ti vivo e ninguém pensa
mas eu sigo um caminho de silvas e de nardos
uma intensa ternura que persigo
rodeada de cardos por tantos lados.

Por ti morro e ninguém sabe
mas eu espero o teu corpo que sabe a madrugada
 o teu corpo que sabe a desespero
ó minha amarga amêndoa desejada.





     2 (573x138, 100Kb)

NEL CÂNDIDO - NA IGREJA PEQUENINA




NA IGREJA PEQUENINA

NEL CÂNDIDO

Na igreja pequenina
e tão pobre, lá na roça,
esquecida pelo povo
que mal vai ali orar,
um menino e sua mãe
nela entraram, a descansar
da caminhada e da vida.
Enquanto a mãe a Deus falava, 
o pequeno observava, curioso,
a imagem de Francisco, 
o bom santo de Assis,
e uma aranha, junto à barba,
que tecia uma teia.
Continuando a jornada,
ao filhinho a mãe pergunta:
"- Você rezou ao Pai do céu?"
Balançando a cabeça -
o seu não como resposta - 
o garoto disse à mãe:
"- Eu olhava aquele homem
parado, em cima da mesa,
e a barba que crescia, crescia, crescia..."
Sem entender-lhe o que dizia
 a mulher e seu menino andavam, andavam, andavam...

POESIAS PSICOGRAFADAS - CONSOLAI




CONSOLAI

ANTERO DE QUENTAL
                         (Psicografia de Francisco Cândido Xavier)

Se eu pudesse, diria eternamente,
Aos flagelados e desiludidos,
Que sobre a Terra os grandes bens perdidos
São a posse da luz resplandecente.

A dor mais rude, a mágoa mais pungente,
Os soluços, os prantos, os gemidos,
Entre as almas são louros repartidos
Muito longe da Terra impenitente.

Oh! se eu pudesse, iria em altos brados
Libertar corações escravizados
Sob o guante de enigmas profundos!

Mas, dizei-lhes, ó vós que estais na Terra,
Que a luz espiritual da dor encerra
A ventura imortal dos outros mundos!

ANTONIO CÍCERO - GUARDAR


               

GUARDAR

ANTONIO CÍCERO

Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.

Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.

Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado poer ela, 
isto é, estar por ela ou ser por ela.

Por isso melhor se guarda o voo de um pássaro
do que um pássaro sem voos. 

Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que  guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.

               

ADÉLIA PRADO - A SERENATA


(450x50, 15Kb)

A SERENATA

ADÉLIA PRADO

Uma noite de lua pálida e gerânios
ele virá com a boca e mão incríveis
tocar flauta no jardim.
Estou no começo do meu desespero
e só vejo dois caminhos:
ou viro doida ou viro santa.
Eu que rejeito e exprobo
o que não for natural como sangue e veias
descubro que estou chorando todo dia, 
os cabelos entristecidos,
a pele assaltada de indecisão.
Quando ele vier, porque é certo que vem,
de que modo vou chegar ao balcão sem juventude?
A lua, os gerânios e ele serão os mesmos
- só a mulher entre as coisas envelhece.
De que modo vou abrir a janela, se não for doida?
Como a fecharei, se não for santa?

(450x50, 15Kb)