quarta-feira, 17 de junho de 2015

CARLOS DRUMOND DE ANDRADE - NÃO SE MATE


   

NÃO SE MATE

CARLOS DRUMOND DE ANDRADE

Carlos, sossegue, o amor
é isso que você está vendo:
hoje beija, amanhã não beija, 
depois de amanhã é domingo
e segunda-feira ninguém sabe
o que será.

Inútil você resistir
ou mesmo suicidar-se.
Não se mate, oh não se mate,
reserve-se todo para
as bodas que ninguém sabe
quando virão,
se é que virão.

O amor, Carlos, você telúrico,
a noite passou em você,
e os recalques se sublimando,
lá dentro um barulho inefável, 
rezas, 
vitrolas,
santos que se persignam, 
anúncios do melhor sabão,
barulho que ninguém sabe
de que, pra quê.

Entretanto você caminha
melancólico e vertical.
Você é a palmeira, você é o grito
que ninguém ouviu no teatro
e as luzes todas se apagam.
O amor no escuro, não, no claro,
é sempre triste, meu filho, Carlos,
mas não diga nada a ninguém,
ninguém sabe nem saberá.

   

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