domingo, 7 de abril de 2013

VICENTE DE CARVALHO - DESLUMBRAMENTO


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DESLUMBRAMENTO

VICENTE DE CARVALHO

Quanto durou essa ilusão perdida,
Esse amor, esse encanto, essa alvorada?
Dias ou meses, não o sei, querida:
Foi um clarão que me passou na vida,
Sei que fulgiu, sei que passou, mais nada.

Durante o arroubo da paixão, quem há de
Notar o tempo que a fugir se esgueira?
No amor, ventura ou infelicidade,
Uma esperança dura a vida inteira,
Um desengano é toda a eternidade.

No absorto enlevo desse amor tão raro,
No êxtase dessa adoração radiosa,
Passava o tempo? Nunca pus reparo:
A madrugada era um botão de rosa
Desabrochando em teu sorriso claro;

Havia noites? Ainda agora penso
No olhar de uns olhos negros - céu imenso
De estio em noite sonhadora e calma,
Céu luminoso, a palpitar, suspenso
Sobre essa terra em flor que era a minh'alma;

Fosse inverno ou verão, ou noite, ou dia,
A natureza inteira, humilde escrava
Dos arroubos da minha fantasia,
Em cada voz - o teu louvor cantava,
Do teu fulgor - toda resplandecia.

Sim, esse sonho esplêndido - vivi-o!
Quando? E quanto durou? Bem pouco importa...
A minha vida, agora, é como um rio
Que leva à tona, sob um céu sombrio,
A murcha flor de uma esperança morta.

"Ah, quem assim me fala ama-me ainda",
Dirás contigo. Em alta voz o nego:
Que resta em nós dessa existência finda?
Tu, sempre encantadora e sempre linda,
És a mesma, talvez... Mas eu estou cego.

Amei-te, já não te amo. Não, de certo.
Tu foste uma miragem deslumbrante
Que em meu sonho feliz sonhei tão perto,
E desfez-se, deixando-me diante
Da tristeza vazia do deserto.

O amor de que te amei tão loucamente
Era como um olhar que o céu alcança:
Para ti, alto céu resplandecente, 
Todo se erguia, no êxtase de um crente,
Feito de adoração - e de esperança.

E hoje, que para toda a eternidade,
Eu despertei do sonho de um momento,
Hoje, na sombra, penso com saudade
Que o teu encanto era uma claridade
E o meu amor foi um deslumbramento.

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