terça-feira, 17 de dezembro de 2013

ANTONIO MIRANDA - MEU PAI


        

MEU PAI

ANTONIO MIRANDA

Meu pai era bonito. E mulherengo.
Igual a tantos naquelas terras de homens
e de aventurança, de vidas empobrecidas,
de marasmo e suor nas virilhas,
onde apenas o cemitério segurava aquela gente
errante e retirante.

A rua acabava no rio
e ele, no bar, pelo caminho.

Vi, então, meu pai inteiro, desnudo,
tomando banho de caneco
e me apaixonei por ele
- eu tinha meus nove anos
e me reconheci no espelho avesso
de nossas diferenças.

Ele, tão libertino.
Eu, introvertido, escrevendo versos.

Mas o cigarro abreviou-lhe a vida
e as finanças da família,
virou fumaça e lágrimas.

Levitando como nuvem estacionada,
lá está ele segurando uma balança,
lembrança dos tempos de garimpo.

Diante de deus, de joelhos
- noves fora nada. Derradeira sentença,
dizia minha mãe desventurada.

Mas eu agora tenho os cabelos brancos
e espessos que ele me legou
mas não aquele olhar possessivo,
aquele olhar sentencioso e definitivo
que me conquistou
como o anti-herói.

     

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